domingo, 22 de novembro de 2015

O BRILHO DAS ESTRELAS

Marcos 13, 24 – 32

O ano litúrgico já se avizinha do seu fim. Para recomeçar outro ciclo de liturgias, o Ano C, do evangelho de São Lucas. Louvo e agradeço a Deus ter iniciado estas reflexões que me têm trazido a presença de Jesus e possibilitado vê-lo de uma maneira diferente e única, nesta fase em que se encontra o meu ministério sacerdotal.

É grande a lição do apóstolo das gentes, São Paulo, quando diz: “Ai de mim se eu não evangelizar.” (1 Cor 9, 16) Confesso que, de início, não senti tanta saudade da pastoral como senti da pregação. A Palavra de Deus está impregnada em um sacerdote como algo próprio. Não fiz questão de publicá-la, não foi algo que eu pedisse ou procurasse, mas o convite de um blogueiro que me acordou do sono e da dormência em que me anestesiaram.

Caro leitor, ainda que não mais pudesse falar da mensagem de Jesus continuaria a escrever estas reflexões. Não as chamo de meditações, como já me perguntaram, porque a proposta aqui é outra. Entendo que meditar é quando o pensamento se volta para a o interior do próprio pensamento, enquanto a reflexão é a sua projeção, o pensamento logo depois da meditação, quando ele se lança na aventura de se aplicar à existência, ou melhor, depois de se perguntar o que Jesus disse aos seus discípulos, na reflexão se pergunta o que isso tem a ver comigo. Naturalmente, uma boa reflexão nasce de uma boa meditação.

24 Naqueles dias, depois da grande tribulação, o sol vai se escurecer e a lua não brilhará mais,
25 as estrelas começarão a cair do céu e as forças do céu serão abaladas.

Meu Deus, quais tempos serão esses de escuridão embrenhada, em que não haverá luz e os céus se abalam? Isto ainda vai acontecer ou poderíamos trocar o início desta perícope para ‘em nossos dias’, e essas palavras não pareceriam falar de uma realidade futurística, mas do presente?

Muitos de nós já passam por grandes tribulações. Na linguagem bíblica a tribulação é a provação do fiel. Um crente que não foi provado ainda não é um fiel amadurecido. O que talvez diminua tanto a qualidade dos membros de igreja. Nós temos a tendência de fugir das tribulações, quando Jesus disse: “No mundo haveis de ter muitas tribulações, mas coragem eu venci o mundo.” (Jo 16, 33) Só saberemos do que somos capazes de fazer e aonde ir no final. Sem a coragem de subir a montanha Abraão jamais conheceria a própria fé. Será que Deus não sabia do coração do seu servo? Quem imaginaria que Deus queria levar o patriarca ao cume da própria fé quando pediu o sacrifício do seu maior bem, o seu filho único? Com certeza o Abraão que sobe ao monte não é o Abraão que desce dele. Vale a pena reler aquela passagem em Gênesis 22.

Um tempo de escuridão e de queda de estrelas! Não pense o leitor que Jesus esteja falando da astronomia e da física. Escuridão é a vida sem fé, pois Ele é a luz do mundo (Jo 8, 12) e suas estrelas somos nós mesmos, sua criação, quando refletimos sua glória. Caíram os anjos, caem os seus arautos, cai também a natureza. Há catástrofe maior do que a queda de um desses? “É inevitável que haja os escândalos, mas malditos aqueles pelos quais eles vêm!” (Mt 18, 7) São palavras duplamente duras! Não descure, todavia, quando alguém atira outro no abismo também este se torna maldito.

Os abalos das forças celestes, reconhecidas nesta terra, expressam uma faceta da oração de Jesus que não está clara: “assim na terra como céu.” Esta expressão parece um código que precisa ser bem decifrado. Será que de alguma forma se liga ao poder das chaves? “o que ligares na terra será ligado nos céus.” (Mt 16, 19) As semelhanças nas palavras estão mais próximas do que as suas teologias, eu sei, mas não custa provocar a reflexão.

Perdoem-me os exegetas! Mas este verso 25 fala da “queda das estrelas” e do “abalo dos céus”. Quem sabe se quando os refletores de Cristo se apagam não tenham desligado a energia? Se o lugar das estrelas é no céu e, se elas não brilham mais, o céu também está escuro. Há muito se apagaram e o céu não é mais céu. Ao menos não pode mais ser visto. Os céus se abalam com a queda das estrelas, mas se rejubilam com a conversão de um só pecador. (Lc 15, 7) Logo estrelas que caem e pecadores que se convertem mudam os céus.

26 Então vereis o Filho do homem vindo nas nuvens com grande poder e glória.

Vê, caro leitor, sozinhos não conseguiremos equilibrar essa desproporção! Sem a intervenção divina será impossível reconciliar céus e terra. Jesus é a ponte e a escada da humanidade. Tudo se resume no fato de Ele ser a Luz. A obra prima de Deus. O primogênito de toda criatura, (Col 1, 15) de onde decorre todo o resto. “Faça-se a luz e a luz se fez”. (Gn 1,3) “Gerado, não criado”, como se reza no credo católico. A Vida da vida, pois “por Ele é que tudo foi feito.” (Col 1, 16) É a intervenção de Jesus no mundo que equilibra qualquer força opositora, mesmo a nossa própria degenerescência, ou seja, aquilo que há de mais obscuro em nós mesmos, não o mal externo, mas a escuridão interior, uma inclinação tendenciosa, ou se preferir, “o lado escuro da força”, como no filme Guerra nas Estrelas.

Estes versos apontam para algo inusitado. Quando a dor for insuportável; quando sentir que está na maior tribulação da sua vida; quando estiver à beira do abismo; quando a sua luz se apagar e tudo parecer trevas; então aí se verá a glória e, no seu limite, descobrirá que a cruz é alavanca que rolou a pedra da ressurreição. Ergue-te, ó grão, pois enterrado tu és semente e teu destino é brotar! Alça voo, ó ave peregrina, pois, se não há galhos ou chão, tu tens asas!

27 Ele enviará os anjos aos quatro cantos da terra
e reunirá os eleitos de Deus de uma extremidade à outra da terra.

Os eleitos, os que se deixaram eleger e os que se candidataram. De fato, na nossa religião, não há lugar para pretensões ambiciosas. Nem se compra o dom de Deus (At 8, 18 – 20), nem se arroga méritos sobre ele. Mas se ingressa no grupo dos discípulos e espera seu nome ser chamado no Livro do Cordeiro.

Percebeu como este evangelho trata do apocalipse de Marcos? Sua estrutura apresenta aquele dia das revelações finais e do destino de todos nós. Não seria exagero nosso enxergar nos quatro cantos da terra, além da Rosa dos Ventos, os quatro Cavaleiros do Apocalipse que desfecharão aquela hora de peste, guerra, fome e morte, bem como da coroação dos mártires, dos pacíficos, dos solidários e dos justos; lá se encontrarão os eleitos. Como sabê-los? Certamente não serão os causadores das desgraças, mas as suas vítimas. Assim se concluirá o Armagedom.

28 Aprendei, pois, da figueira esta parábola:
quando seus ramos ficam vedes e as folhas começam a brotar, sabeis que o verão está perto.

A sabedoria do Evangelho só é loucura para aqueles que o desprezam. A Boa Nova de Jesus se fundamenta em duas bases que Ele uniu como ninguém: a sabedoria de Deus e a sabedoria popular. Uma Ele conheceu no céu, a outra aqui na terra. Quantas vezes Jesus falava de Deus e do céu a partir da terra? Isto indica que a lei natural não está contra a lei de Deus, mas é seu resumo. Daí porque quando não conseguirmos mais entender o que lemos na natureza precisamos ir às fontes.

A verdadeira sabedoria é aquela que conduz ao conhecimento das fontes originais. Em muito a ciência reclama a sua vez na história da humanidade, já que outros saberes perderam seu espaço, no entanto, sem reconhecer quem lhe deu fundamentos, melhor, quem tem as respostas que ela procura. Tanto mais se faça ciência, mais se aproximará das origens e fundamentos, da causa primeira e última de todas as coisas. Assim o foi com a “Partícula de Deus”, assim será com o “Pentaquark” e todas as novas descobertas ou confirmações.

Em tudo, meu leitor, fixa bem o teu olhar e entenda; perceba o mundo à sua volta; enxerga além de um palmo adiante do nariz; vê além do próprio umbigo; viva, mas vivencie, coma, mas deguste; aprenda, mas explique e transforme; creia, reze, mas “brilhe a sua luz perante os homens para que eles vendo as suas boas obras glorifiquem a Deus.” (Mt 5, 16)

29 Assim também, quando virdes acontecer estas coisas, ficai sabendo que o Filho do homem está próximo, às portas. 30 Em verdade vos digo, esta geração não passará até que tudo isso aconteça;

No início do cristianismo, a demora da segunda volta de Jesus foi quem levou os cristãos a se organizarem e se estruturarem para esperar aquele tremendo dia. Esta é uma intenção que não deveria ser esquecida. Nós não estamos reunidos hoje para nos encontrarmos simplesmente, como se esta fosse a finalidade das assembleias cristãs ou a sustentação das instituições religiosas que congregamos ou ainda que aquele dia não estivesse mais próximo. Ele está às portas, lembremos isto! Os cristãos se reuniam para esperar o Senhor.

31 O céu e a terra passarão, mas as minhas palavras não passarão.
32 Quanto àquele dia e hora, ninguém sabe, nem os anjos do céu nem o Filho, mas somente o Pai.

Às vezes tenho a infeliz impressão de que não esperamos mais a Sua volta. Não nos preparamos mais para o desfecho de nossas vidas. Nós temos nos preocupado tanto com a manutenção do status quo, em deixar as coisas como estão, e esquecemos que tudo isso passará; nada há de ficar como está. “Agora, pois, permanecem a fé, a esperança e o amor, estes três, mas o maior destes é o amor.” (1 Cor 13, 13) Vejam se não pregamos mais umas coisas que, embora necessárias, dão lugar à essencial. Estou convencido de que precisamos mudar alguns temas e a forma de apresentar as nossas pregações. E você, o que você acha?

Esperemos sempre no Senhor! Aguardemos a sua feliz chegada. Que Ele não se acanhe em ingressar em nossa vida, nem sempre preparada, jamais digna de Sua visita, mas sempre necessitada. Disso Ele sabe! Tenha uma abençoada semana e nos amemos. Rezemos uns pelos outros!

Glória ao Pai e ao Filho e ao Espírito Santo...
15.11.2015

Pe. Adeilton Santana Nogueira

domingo, 8 de novembro de 2015

POBRES MILAGROSOS

Mc 12, 38 – 44
A cada domingo vimos partilhando o evangelho que é lido mundialmente em todas as missas católicas, salvo alguma situação particular, orientados pela visão sinótica de São Marcos evangelista que, segundo a tradição, apesar de muito novo, já acompanhava seus pais no discipulado de Jesus. Marcos também viajou a derradeira vez de Pedro a Roma, onde recolheu as suas pregações e,mais tarde, compilou o seu evangelho.
Sinóticos que dizer ‘a mesma visão’, referindo-se também aos evangelhos de Mateus e Lucas. Porém, sabemos que, dos três evangelistas, o único apóstolo foi Mateus. Logo, dos três sinóticos, apenas um foi testemunha ocular, o que leva a crer que havia outros olhos, a saber, outras fontes dos feitos e ditos de Jesus, e não os próprios autores.
Digo isto porque Marcos estava em Roma quando escreveu o seu evangelho. Pedro fora martirizado, crucificado de cabeça para baixo; a comunidade estava desolada sem os seus maiores bispos. Mesmo com outros discípulos na sucessão tudo era muito recente, dramático e as distâncias não ajudavam a comunicação com Jerusalém e outros centros fervorosas, inclusive com as missões paulinas, dispersas entre os pagãos. Alguns se adiantavam em escrever e falar sobre Jesus. As contendas entre os pregadores já começavam, bem como os sínodos para dirimi-las. A fim de não se perder a memória da vida de Jesus e guardar o essencial de seus ensinamentos eles precisavam de uma catequese segura e fiel.
Nem tudo poderia ser escrito em palavras, pois Jesus também não escreveu nada. Começa-se então a definir o conteúdo da pregação, a saber, contar a vida de Jesus. Nisto consistiam as primeiras pregações que definiram a estrutura dos evangelhos e sua validade. A infância, a pregação pública, a paixão, morte e ressurreição, tornaram-se a estrutura dos evangelhos, o que descartou, na época, outros textos que chamamos de apócrifos, pois não eram usados nas comunidades; apesar de hoje causar alguma curiosidade. Por este mesmo motivo não entraram no cânon da Bíblia. Jesus nunca foi espalhafatoso, esnobe, nem mesmo miraculista. Sua vida foi simples, escondida e rejeitada, inclusive pelos próprios seguidores, conterrâneos ou parentes.
Embora Ele não se abalasse com uma popularidade controversa, havia um grupo de judeus que O incomodava frequentemente: a classe dos fariseus. Ser fariseu se tornou sinônimo de hipócrita; uma pessoa que não vive o que prega. Mas a origem dos fariseus é mais bonita do que esta má fama; diz respeito à volta do exílio da Babilônia para reconstrução do Templo e da cidade de Jerusalém, após o edito de Círo. Aquele pequeno grupo, ‘resto’ de Israel, de onde descende o termo fariseu, traz de volta a memória dos anciãos, dos patriarcas e da cultura bíblica que puderam conservar. Voltam como guardiões da fé e se tornam intérpretes e doutores da Lei, perante os seus irmãos, inclusive os que ficaram na miséria da cidade espoliada.
No entanto, ao que parece, a eleição lhes sobre à cabeça e de intérpretes passam a ditadores, de ‘resto’ passam a casta seleta, de guardiões a senhores, e a cultura bíblica vira ideologia em seus trajes e trejeitos. Jesus que a tudo observa se depara em uma situação corriqueira, mas muito atual se mudamos as personagens. Senão vejamos!
38 Jesus dizia, no seu ensinamento a uma grande multidão: “Tomai cuidado com os doutores da lei! Eles gostam de andar com roupas vistosas, de ser cumprimentados nas praças públicas; 38 gostam das primeiras cadeiras nas sinagogas e dos melhores lugares nos banquetes.”
Viraram figuras alegóricas, Superstars ou “Famosos”, numa linguagem mais atual. Lembro-me do finado D. Tepe quando nos contara de uma criança que o confundira com o Chacrinha, pelas suas vestes de bispo. Imagino esses fariseus com tantos filactérios, chales de oração, túnicas com senetas nas franjas, verdadeiras árvores de natal ambulantes, mais vistosas que Elke Maravilha. Sei que cada indumentária tem sua descrição e significado, seu simbolismo bíblico; porém Jesus alerta sobre a perda desses valores, quando as roupas viram apenas ornamento e a eleição se transforma em altivez. Eles sentem prazer em parecer melhores e maiores do que os seus irmãos.
40 “Eles devoram as casas das viúvas, fingindo fazer longas orações. Por isso eles receberão a pior condenação.”
Não bastasse serviço e vocaçao virarem arrogância, eles “devoram as casas das viúvas”. Esta nova figura que entra em cena, a viúva, é uma alegoria de Israel e do pecador que vive como alma sem esposo, sujeitos às visitas de ministros que esperam retribuição econômica por seus favores espirituais ou daqueles que se deleitam em longos banquetes às custas dessas senhoras, extorquindo-lhes comida, casa e dinheiro. Suas orações são fingimento e sua prática charlatanismo infernal. Mas não nos preocupemos com esses, “eles receberão a pior condenação”, preocupemo-nos com elas, as pobres e solitárias viúvas que se doam por atenção.
41 Jesus estava sentado no templo, diante do cofre das esmolas, e observava como a multidão depositava as suas moedas o cofre. Muitos ricos depositavam grandes quantias.
Dizem que é na hora da refeição que se conhece o lado animal de cada um. Talvez seja na hora de doar que se conheça o lado humano. Observar quem dá mais ou menos é uma prática comum na igreja, desde Jesus. Não é feio nem errado. O homem livre não se importa com nada que venha de fora, pois não o diminui. Todavia, como tudo que sai do homem pode fazer mal, é ele quem deveria olhar profundamente sempre que for doar. Quem tem mais dá mais, uma vez que dá do que tem. A surpresa será: Tendo muito, dar pouco ou tendo pouco, dar muito.
42 Então chegou uma pobre viúva que deu duas moedas, que não valiam quase nada. 43 Jesus chamou os discípulos e disse: “Em verdade vos digo, esta pobre viúva deu mais do que os outros.”
O rico fez o que devia, mas a pobre fez o que não devia, ou melhor, o que não podia; foi além de si mesma e das expectativas dos outros. Curioso é que ela deu moedas “que não valiam quase nada” e mesmo assim “deu mais do que os outros.” Sobre falar de dinheiro na igreja, está aí uma coisa que deveria precisar pedir, bastaria continuar acreditando na generosidade das pessoas de fé. Não deveria ser assim?
Algumas igrejas falam mais de dinheiro do que de Jesus. Será que o problema dessas instituições está no capital ou na pregação? Igreja não foi feita para se tornar uma potência mundial ou uma multinacional. Igreja é templo; templo é povo; povo é igreja. Meu Deus me perdoe o que vou dizer: mas, talvez as contas não deem para as despesas da igrejas porque as despesas são maiores do que as igrejas. Que igreja é esta que tem tantos ricos, contudo, é sustentada apenas pelos pobres? Ou nem isso!
Parece uma maldição pedir ou fazer campanha. Quanto mais se faz essas coisas, mais precisará continuar fazendo. É um vício que ainda não se entende o quanto o tema e a sua insistência não agradam à devoção. Inclusive, nem toda oferta é dinheiro. Há mais doação de pessoas que de bens, até porque se quer muito mais gente do que os seus bens. Não é verdade?
44 “Todos deram do que tinham de sobra enquanto ela, na pobreza, ofereceu aquilo que possuía para viver.”
Não é porque todos estão em crise econômica que as contas não batem. Segundo este evangelho, precisamos confiar mais; ricos e pobres darem do que tem. Arriscaria em dizer que, talvez, o grande engano, do crente ao pagão, seja fechar a mão e não participar, alegando que não tem nada. Assim como fugir no medo, partilhar na necessidade será um dilema, um risco a se correr, se ainda houver fé. Mas, não será se negando em dar do que tem que se garantirá segurança pessoal, muito menos será mais humanos. Quando a vida é orientada pela espiritualidade o milagre só acontece na provação;  quando a última medida de farinha e a última gota de azeite estiverem no fim.
É lamentável que mesmo em igrejas se queira o milagre para si, mas não queira ser o milagre para o outro. Como disse um padre amigo: “Ele vê de perto o que estamos oferecendo a Ele.” Lembremos que dar é o gesto mais simples do desprendimento, desprender-se é a essência da pobreza e os pobres em espírito herdarão o reino dos céus (Cf. Mt 5, 3). Se a viúva de Sarepta não decidisse saciar a fome do profeta Elias, partilhando consigo a sua última refeição, talvez nunca experimentasse a fartura de uma vasilha repleta de poucas medidas, generosa e miraculosamente renovadas (Cf. 1 Rs 17, 15).
Desejo a todos uma semana mais ousada na fé, mais humana. Seja o milagre de alguém! Faça e seja a sua oferta!

Glória ao Pai e ao Filho e ao Espírito Santo...
Barra dos Coqueiros – SE, 08.11.2015

Pe. Adeilton Santana Nogueira

domingo, 1 de novembro de 2015

AQUÉM DOS ALTARES

Na Solenidade de Todos os Santos
Mt 5, 1 – 12a

Para muitos, santo é aquele tipo de pessoa que vive isolado do mundo, ainda que more nele, cumprindo todos os preceitos religiosos; um exemplo de pessoa sobre quem projetamos todas as nossas maiores expectativas. Alguém que jamais esperamos que erre. Um abençoado a quem recorrermos que reze por nós quando precisamos. Contudo, não parece ser este o modelo de santidade pregado por Jesus.

A cada época e local surgem os santos próprios na história para dar continuidade ao ensinamento de seus diretores espirituais. Há diversidade de santos tanta quantas forem diversas as circunstâncias da vida e do lugar em que habitam. Nota curiosa esta de que, não só as mazelas, mas as situações de cada tempo produzam no fiel uma resposta precisa de sua espiritualidade ao mundo.

Ao longo de todas as épocas, cristãs ou não, mesmo antes da Bíblia, quando ainda nem pensavam ou precisaram escrevê-la, sempre houve santos e santas. Estes são elencados por Jesus como sendo os pobres, os aflitos, os mansos, os injustiçados, os misericordiosos, os puros, os pacíficos, os perseguidos e os difamados.

Quer saber se você é santo ou está no caminho da santidade evangélica? Procure em qual dessas classes você se encontra hoje. Alguns de nós se preocupam mais com o mérito da questão do que com a honra da conquista. Colocam “o carro a diante dos bois”. Estão mais interessados nos resultados do que nos meios para conquistá-los.

Não raro encontramos fieis que querem logo o Reino dos Céus e o promovem a qualquer custo, como se competissem na sociedade. Há outros que querem ser consolados instantaneamente, pois estão convencidos de que o seu sofrimento é maior do que o dos outros; querem também possuir a terra antes de ressuscitarem, pois seu pragmatismo é tão comercial que acumulam muitos bens. Alguns querem ser saciados pois a sua insegurança advoga em causa própria e fazem justiça com as próprias mãos; pregam o “venha a nós o vosso reino” mas esquecem do ‘seja feita a Vossa vontade”. Ainda mais esperam misericórdia porque sabem que já machucaram muitas pessoas. Eles dizem ver Deus, quando apenas projetam seus devaneios cegos. Querem ser reconhecidos como filhos de Deus, uma vez que aparecerem mais do o próprio Jesus.

Quantos desses aceitariam ser perseguidos por causa da justiça ou tolerariam mentiras contra si, por causa de Jesus? O que é mesmo ser santo nos dias de hoje? E como reconhecer um desses escolhidos? Como distinguir os abençoados entre os bem sucedidos e os fracassados? Como reconhecer um charlatão mentiroso e um autêntico discípulo de Jesus? Penso que o santo se parecerá mais com o seus guia espiritual do que consigo mesmo, inclusive.

Os caminhos já foram indicados. Não quero aqui inaugurar outra estrada. As setas apontam para a pobreza, aflição, mansidão, injustiças, misericórdia, pureza, pacificidade, perseguição e difamação. Eu sei que não é uma trilha fácil de se enveredar. Nenhuma delas é atrativa, creio que nunca foram. Jesus as experimentou e conhecemos o seu fim. Porém urge que as religiões repensem suas pregações e aonde querem chegar com elas. Revejam suas decisões e posturas, desde os seus ministros aos seus adeptos, pois, independente dos altares, os santos que caminham são cada vez menos vistos entre nós, apesar do crescimento do número de fieis.

Desejo-lhe a coragem necessária para a santidade aquém dos altares, sem a qual jamais haveriam santos.

Glória ao Pai e ao Filho e ao Espírito Santo...

Barra dos Coqueiros – SE, 01.11.2015
Pe. Adeilton Santana Nogueira