Já vimos no
artigo anterior que Dasein é expressão
alemã, em Heidegger, para designar o SER-AÍ, em sua existência e presença
situada; um palavra-síntese que expressa a importância da existência como
presença significante, percebida. A filosofia de Martin Heidegger pretende compreender
o Ser e levantar-lhe questionamentos. Daí porque é tão importante preferir o
conceito de Ser ao de Ente, em particular. O Ser-Aí (Dasein) tem a sua
compreensão do Ser (Seinsverständnis)
tão
particular que será sempre sua (Jemeinigkeit). Vejamos então estes termos do vocabulário heidegueriano.
A COMPREENSÃO DO
SER
Logo no começo de seu
livro, Ser e Tempo, Heidegger se detém na questão do Ser, que se coloca àquele
Ente privilegiado que é capaz de questionar o Ser. Cada Ser-Aí possui uma “compreensão
do Ser”, que ele chama de Seinsverständnis. Heidegger apresenta este
ente que pode compreender o Ser: o homem. Por isso o chama de "ser-aí"
– Dasein – o homem enquanto um ente que existe imediatamente em um mundo e
é capaz de entendê-lo e lhe dar sentido (§4).
Por meio do termo Dasein,
que define o ponto de partida do seu modo de analisar a existência dos seres, o
filósofo pretende ultrapassar a separação entre sujeito e objeto, que ele
considera uma herança prejudicial da filosofia moderna, na compreensão do que
ou quem seja o homem. Dasein é, portanto, o homem na medida em que
existe na existência cotidiana, no dia-a-dia junto aos outros homens, em seus
afazeres e preocupações.
Para entender o Dasein,
o homem em sua presença, enquanto
possui sempre uma compreensão de ser, impõe-se uma analítica existencial,
que tem como tarefa explorar a conexão das estruturas que definem a existência
do Dasein, a saber, os existenciais. Ser e existir vão se completando em
sentidos que definem as pessoas e as coisas. Há um método que ajuda nessa
tarefa de descoberta e interpretação: o método da analítica existencial. Ele é
buscado tanto na fenomenologia, que
analisa os fenômenos (as coisas enquanto acontecem), quanto na hermenêutica (que interpreta o
sentido delas), de modo que este método se chama fenomenológico-hermenêutico
(idem, §7). O ponto de partida é a própria manifestação do Dasein, ele
mesmo em sua existência que, por sua vez, tem de ser interpretada de dentro
para fora em suas principais estruturas ontológicas (ente e ser) que a definem
e que permitem a colocação da questão do Ser.
A questão do Ser do Dasein
é investigada tanto segundo a fenomenologia, do "ir às coisas nelas
mesmas" [zu den Sachen selbst], a coisa enquanto tal, como se
manifesta e se dá a conhecer, quanto na hermenêutica, da "interpretação no
horizonte da compreensão", daquilo que se pode compreender.
Por meio da
existência do homem, Heidegger apresenta uma abertura até o Ser e, para isso,
recorre a uma linguagem nova. Dasein são duas palavras em uma: “da” que significa ‘aí’ + “sein” que significa ‘ser’, ou seja, a
existência enquanto ‘ser que está aí’, sintetizado por SER-AÍ, entendido como
presença situada. A pessoa quando sai da hipnose que o aliena e cega do mundo à
sua volta e lhe faz agente, atuante e consciente, responsável pela significação
das coisas.
Nesta investigação, segundo
este método, a existência que se manifesta ao Dasein é sempre
primeiramente ligada a ele mesmo, à sua compreensão que se coloca
para o ser-aí antes de qualquer teorização. Heidegger nega a ideia de que,
em filosofia, seja necessário estabelecer princípios como a base inabalável de
um sistema filosófico. Ao contrário, ele está empenhado em pesquisar como ocorre
a primeira e mais original compreensão do homem em sua existência mesma, antes
das teorizações. A teoria sempre chega depois da consciência do homem e daquilo
que se revelou ele na sua existência.
O SEMPRE MEU
A fidelidade à análise
existencial tem de partir, do ser que é sempre dono de sua existência –Jemeinigkeit
(“o sempre meu”), outra
palavra original que designa aquilo que pertence apenas a si mesmo, e de não se
acomodar previamente numa teoria que explique de fora o que é a existência
humana. O ponto de partida, portanto, é duplo: tanto o ser-aí quanto a
compreensão imediata que ele mesmo tem do ser em sua existência, as quais
precedem toda a atividade científica e de saber.
Em suma, o Ser-Aí é
imediatamente o homem e o mundo ao mesmo tempo, em sua realidade finita
imediata, entregue ao seu destino. Desse modo, o homem também não é uma mera
coisa que reside inerte em um mundo de necessidades;
pelo contrário, na medida em que compreende o Ser, o homem se coloca no campo
da possibilidade, da transcendência
e elabora as possibilidades de sua existência.
No próximo texto veremos o
alerta do filósofo às interpretações pré-fabricadas, sem considerar este homem
localizado que se dá conta do mundo à sua volta e lhe descobre o sentido. De antemão,
não deixe o leitor tal atenção, do quanto a ciência e os demais seres-aí lhe
ditam o conceito de todas as coisas, sem lhe considerar a existência presente
e consciente.
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